Não me recordo de ter visto meu pai chorar no funeral da minha mãe ou em qualquer outra ocasião nos últimos dias dela. Ele parecia ter assumido o encargo de consolar a todos. Mas, certa noite, depois do enterro, vi meu pai chorar diante de nossa velha geladeira,ao ver tudo o que mamãe tinha colocado nela. A geladeira estava coberta de lembranças da vida de minha mãe. Quando meus pais se casaram,compraram a geladeira de segunda mão. Minha mãe se propôs a pintá-la de uma estranha cor amarela quando a geladeira quebrou e precisou de uma peça nova, e a mamãe tirou tudo que estava colado nela. A cor estava escondida porque minha mãe a cobrira com todo tipo de coisas: uma história em quadrinhos interessante recortada do jornal, um ditado conhecido, a foto do meu pai, escrituras para decorar, a papeleta da lavanderia, a propaganda de um produto, uma carta a ser respondida, uma receita, a lista de compras, a lista de telefones da ala e até nossos boletins. À medida que fomos crescendo, ela foi acrescentando listas de tarefas da semana, compromissos e mensagens para a família. Não tínhamos um quadro-negro nem um quadro de avisos,por isso nossos pais também grudavam gravuras do evangelho na geladeira. Em fevereiro, o mês dos namorados,minha mãe colava na geladeira um grande coração com o nome de cada um escrito nele;em março, a foto do seu casamento e uma lista de coisas que ela gostaria de ganhar no seu aniversário.Junho era dedicado ao meu pai, porque era o mês do aniversário dele-ela fazia o mesmo para cada um de nós,no respectivo mês em que tínhamos nascido. Em setembro, era uma bandeira do México. Em novembro, o mês em que meus pais se lembravam dos antepassados,mamãe colava retratos de entes queridos, criando a oportunidade de falar deles. Em dezembro, ela exibia um pequeno presépio feito de pano. Sempre que um de nós saía em missão, mamãe colava a fotografia do missionário na geladeira, e não tirava dali até que ele voltasse. Quando o único irmão de minha mãe morreu, ela colou na geladeira uma fotografia que tiraram juntos, e nunca mais a tirou dali. Ela nunca disse nada, ,as quando a víamos contemplar tão intensamente a fotografia, sabíamos o quanto seu irmão significava para ela. Juntas, a geladeira e minha mãe uniram a família. Hoje, em minha própria casa, há uma geladeira que, embora seja nova e não tenha uma estranha cor amarela, está aprendendo seu dever de unir e ensinar a família. A velha foto do casamento de meus pais,outra de minha tia e as obras de arte sem forma definida de meus filhinhos estão coladas nela. E quando vejo essas coisas, penso na minha mãe e agradeço a ela por ter-me ensinado a compreender como uma geladeira pode nutrir de muitas outras maneiras além de manter a comida refrigerada.
Nenhum comentário:
Postar um comentário